O Brasil deve crescer 0,8% em 2022, segundo divulgado pelo FMI (Fundo Monetário Internacional) na terça-feira (19). Em janeiro, o órgão havia projetado uma alta de 0,3% – portanto, as expectativas para a economia brasileira melhoraram em relação a três meses antes.
Mesmo com a revisão positiva, o Brasil está entre os países com piores perspectivas de crescimento em 2022. O mesmo acontece para 2023.
Os dados são parte do relatório World Economic Outlook – ou Panorama da Economia Mundial, em português –, que também prevê um ritmo menor de avanço da economia global por causa da guerra na Ucrânia. Neste texto, o Nexo apresenta as projeções sobre o Brasil e conversa com economistas para entender por que as perspectivas para o país são tão ruins na comparação internacional.
As perspectivas para o Brasil
O crescimento projetado de 0,8% do PIB – Produto Interno Bruto, que soma todos os bens e serviços produzidos em um país – faz com que o Brasil esteja entre os países com piores perspectivas para 2022. De 193 países analisados, o Brasil é o 14° com pior expectativa de crescimento pelo FMI no ano.
Os piores são Ucrânia (queda de 35%) e Rússia (queda de 8,5%), protagonistas do maior conflito bélico na Europa em décadas. A Rússia também é alvo de sanções de países desenvolvidos e boicotes de empresas por causa da invasão à Ucrânia.
180° de 193 é a posição do Brasil nas projeções de crescimento para 2022 segundo o World Economic Outlook do FMI
Além de revisar para cima o crescimento brasileiro projetado para 2022, o FMI também mudou a previsão de 2023. Mas, desta vez, o número foi alterado para baixo, de 1,6% para 1,4%.
O número coloca o Brasil na décima pior colocação de crescimento esperado para 2023. Ao todo, 191 países são analisados – a diferença com relação aos 193 listados em 2022 se deve à ausência de projeções para Ucrânia e Tunísia.
Os números significam que o FMI espera que o Brasil cresça apenas 2,2% ao todo no biênio 2022-2023. É o sétimo pior resultado do mundo. As piores projeções são de Rússia e Belarus.
Outros dados econômicos
O PIB é o principal indicador de atividade econômica. Mas não é o único dado acompanhado e projetado pelo FMI.
O órgão internacional projeta que o desemprego no Brasil fique em 13,7% em 2022. O número é consideravelmente mais alto que os 11,2% registrados pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) entre novembro de 2021 e janeiro de 2022.
O fundo também diz que o Brasil deve fechar o ano com uma inflação de 6,7% em 12 meses. Na comparação internacional, o número está longe dos mais altos, ficando na 69ª posição entre 192 países.
O relatório do FMI também aponta que o Brasil é um dos países com maiores taxas de juros do mundo. O Banco Central começou em março de 2021 um ciclo de aumentos da taxa Selic, a taxa básica de juros, até chegar a 11,75% ao ano em março de 2022.
A inflação elevada e os juros altos são marcas da economia brasileira no primeiro semestre de 2022. O país também vive uma grave crise social. A pandemia de covid-19 agravou o cenário da fome. Há relatos de miséria, fila para conseguir ossos e restos de carne, famílias cozinhando com lenha por não conseguir pagar por um botijão de gás e aumento da população de rua.
Por que o Brasil tem perspectivas tão ruins?
O Nexo conversou com economistas para entender por que as perspectivas para o Brasil são tão ruins, ainda mais quando se considera a comparação com outros países.
Luiz Carlos Delorme Prado, professor do Instituto de Economia da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), afirmou ao Nexo que “o cenário projetado à frente nada mais é do que uma continuidade” da trajetória econômica fraca de anos anteriores à pandemia.
Em 2015 e 2016, o PIB teve quedas acima de 3%. Em 2017, 2018 e 2019, o crescimento anual ficou abaixo de 2%. Em 2020, a pandemia levou a um novo tombo, desta vez de 3,9%. E em 2021, houve crescimento de 4,6%, considerado insuficiente para gerar otimismo por diversos economistas ouvidos pelo Nexo.
Segundo Delorme Prado, “o Brasil está em um processo de estagnação sem nenhum horizonte de saída”.
Para o professor da UFRJ, o país não mantém “qualquer estratégia de política econômica auto sustentável” desde 2015. Delorme Prado disse que a agenda de reformas fiscais adotada desde aquele ano é pensada apenas para o curto prazo, e que as reformas “não fazem parte de uma estratégia de desenvolvimento”.
Ele ainda afirmou que o Brasil dificilmente conseguirá crescer de forma sustentada sem avançar no sentido da resolução do problema da distribuição de renda – o Brasil “é um caso extremo” de desigualdade, de acordo com Delorme Prado. Além disso, ele destaca que a questão do emprego é outro fator que contribui para piorar as perspectivas da economia brasileira, já que muitas pessoas estão fora do mercado de trabalho.
Outra análise sobre as projeções
Antonio Carlos Alves dos Santos, professor de economia na PUC-SP, segue a mesma linha de Delorme Prado ao criticar aquilo que chamou de “uma política econômica errática”, em que não há clareza sobre as intenções estratégicas do governo.
Ele afirmou que ora o governo de Jair Bolsonaro sinaliza que adotará medidas liberais e de austeridade, ora segue uma linha intervencionista. Um exemplo citado foi o caso da Petrobras, no qual o governo diz que não irá intervir na empresa, ao mesmo tempo que o presidente critica a política de preços da empresa.
“O que nos falta é uma política econômica minimamente coordenada, com alguma racionalidade – seja numa linha liberal ou numa linha desenvolvimentista”, afirmou dos Santos ao Nexo.
Além disso, o professor da PUC-SP disse: “Acredito que o Brasil tem muito mais incerteza [que outros países], seja no plano da política econômica, seja no plano político”. Essa incerteza, para ele, é o fator central que explica o mal posicionamento do Brasil no ranking de crescimento previsto para 2022 e 2023.
A questão fiscal brasileira também ajuda a alimentar essa incerteza, segundo dos Santos. “O Brasil precisa discutir a reforma fiscal, que está sendo enrolada há um bom tempo”, afirmou. As contas públicas estão no vermelho desde 2014 – até 2021, foram oito anos consecutivos nos quais as despesas do governo federal (sem contar o pagamento de juros da dívida) superaram as receitas. A crise fiscal também é frequentemente apontada como um dos motivos por trás da recessão que atingiu o país entre 2014 e 2016.
O professor da PUC disse que, nesse sentido, as eleições de outubro de 2022 também servem como um fator de incerteza, já que não se sabe qual será o próximo governo, e nem como será a atuação do ponto de vista fiscal. Em abril, as pesquisas de intenção de voto são lideradas pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), mas a distância tem sido encurtada por Jair Bolsonaro (PL).
Além disso, dos Santos afirmou que “o Brasil não tem uma política adequada de formação da sua mão de obra”, que é necessário investir para que haja um aumento de produtividade no país. “Sem aumento de produtividade, não há como voltar a ter um crescimento sustentável”.
Por fim, o economista também disse que existe a possibilidade de o Brasil crescer mais que o projetado pelo FMI em 2022 e 2023. O principal fator para isso é justamente o quadro externo. A guerra na Ucrânia tem levado a um aumento no preço de commodities, que são mercadorias com pouco valor agregado e quase sem diferenciação, que podem ser negociadas globalmente sob uma mesma categoria.
Sendo o Brasil um exportador de commodities, – como petróleo bruto, soja e minério de ferro – a alta de preços favorece os produtores que vendem para fora. Nesse sentido, o Brasil pode se beneficiar do impacto global do conflito no leste europeu.
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