Tivemos recentemente uma decisão do Supremo Tribunal Federal pela qual foi derrubada a cobrança de uma taxa de fiscalização estadual em razão da desproporcionalidade entre o valor da taxa e o custo da fiscalização. Os advogados que promoveram a ação de inconstitucionalidade demonstraram que a arrecadação da taxa era dez vezes maior do que as despesas orçadas para custear o setor da respectiva fiscalização. Essa decisão certamente vai servir de exemplo para vários outros casos já contestados no STF.
Temos, então, dois parâmetros que limitam os valores das taxas: aqueles que podem ser entendidos como confiscatórios, por serem de valores tão elevados e injustificáveis; e aqueles que ultrapassam de tal modo o custo decorrente do serviço, que se torna “lucrativo” ao poder estatal.
Assim, enquanto os valores dos impostos sofrem duas graduações, a saber: adequar-se à capacidade econômica do contribuinte e não se utilizar da cobrança com efeito de confisco, as taxas se condicionam a evitar os efeitos confiscatórios e ter um valor razoavelmente proporcional ao custo do serviço ou da fiscalização.
Na verdade, o valor da taxa deve ser instituído de modo a observar três condições: a) a capacidade contributiva do contribuinte; não assumir valores confiscatórios; e ser compatível ao custo decorrente. Embora o § 1º do art. 145 da Constituição Federal trate apenas de impostos, a capacidade contributiva no caso das taxas decorre das outras duas condições, ou seja, de não ser de valor confiscatório e de obedecer à regra da proporcionalidade com o custo. Feito isso, a capacidade contributiva restaria respeitada.
A taxa pode ser cobrada em valores fixos, quando a lei já determina o quantum a ser cobrado, ou mediante a adoção de um parâmetro, tipo base de cálculo, e a determinação da alíquota que incidirá sobre o parâmetro instituído. Vale lembrar de que a taxa, ao contrário do imposto, não se socorre da natureza econômica do fato imponível para determinar o seu valor. A taxa sempre se baseia na atividade estatal dirigida ao contribuinte, sendo totalmente incabível determinar valor de taxa tendo por base o movimento econômico do contribuinte, ou o valor venal de seus imóveis. Como se sabe, taxa não pode ter base de cálculo própria de impostos (§ 2º do art. 145, CF).
Se o limite do valor da taxa é o custo, o legislador deve, por evidência, ter conhecimento do custo da atividade estatal para, então, determinar o valor a ser cobrado. Neste sentido, importante apartar inicialmente as taxas de serviços públicos das taxas de poder de polícia.
Taxas de serviços públicos
Para que o legislador institua uma taxa de serviço público, este serviço tem que ser de utilização compulsória, não importa se efetiva ou potencial, e que seja específico e divisível.
A relembrar: os serviços públicos podem ser prestados para todos (gerais) ou prestados somente para pessoas ou grupo de pessoas predeterminadas. Exemplos: serviço de saúde pública é geral; serviço de limpeza de logradouros públicos é geral; já o serviço de coleta de lixo domiciliar é específico. Ou seja, serviço público específico é aquele que proporciona uma utilidade específica para determinado indivíduo.
O serviço público pode ser indivisível ou divisível. Indivisível, quando a sua oferta é de caráter coletivo, não tendo condições de quantificá-lo por pessoa que o utiliza, isto é, são serviços que não permitem o cadastramento individualizado de quem os toma. A antiga taxa de iluminação pública foi considerada inconstitucional justamente por ser a iluminação pública um serviço indivisível. Serviços públicos divisíveis, segundo Rubens Gomes de Souza, são aqueles “que podem ser individualizados e destacados do complexo dos serviços e atividades gerais do Estado”. Sendo possível identificar isoladamente o tomador do serviço, possível inscrevê-lo no cadastro de contribuintes.
Aspecto importante, a diferenciar taxa de preço público é a compulsoriedade que existe na taxa. Não importa se o contribuinte a utilize ou não, a taxa é devida, pois obrigatória. Ao contrário, o preço público não é compulsório, sendo devido somente por aqueles que espontaneamente se servem do serviço, colocado à disposição de quem o desejar.
Pois bem. O valor da taxa de serviço público tem por teto o custo do serviço global, dividido pelo número de contribuintes devidamente cadastrados. O valor pode ser idêntico para todos ou calculado de forma proporcional de acordo com as características dos contribuintes. Exemplo: se a verba orçada para custeio do serviço de coleta de lixo domiciliar é de R$10 milhões/ano, e se o número de imóveis servidos pelo serviço é de 50 mil, a taxa seria de R$200,00/ano para cada contribuinte. Todavia, o legislador pode criar distinções entre os contribuintes. Exemplo: os imóveis de até 70m² de construção pagariam R$100,00 de taxa e os maiores, R$300,00. Evidente que, em tal caso, necessário seria saber o total de imóveis de até 70m² para ter ideia de que o custo total seria efetivamente absorvido pela taxa.
Bom dizer que as leis municipais são repletas de criatividades. Cobranças diferenciadas para imóveis comerciais e industriais, por região, por tamanho do imóvel e tantas outras. Enfim, se o custo total é absorvido pela cobrança total da taxa, pode-se dizer que a lei é razoável, porém, desde que os mais onerados não estejam sofrendo de confisco. O princípio da razoabilidade deve estar sempre presente.
Taxa de poder de polícia
Todos os serviços que liberam licenças, autorizações, alvarás e exercem atividades de fiscalização são serviços de poder de polícia. Nos Municípios, são diversos serviços deste molde: licença para construção, licença para funcionamento de estabelecimentos, vigilância sanitária, fiscalização de posturas e tantos outros.
Em tais serviços, observa-se a prévia existência da especificidade e divisibilidade, pois os contribuintes são exclusivamente aqueles que necessitam de alguma licença para realizar alguma coisa e aqueles que se sujeitam ao exercício da fiscalização.
Da mesma forma, as taxas de poder de polícia são instituídas para cobrir o gasto da Administração Pública com o serviço prestado. Exemplo: quanto custa para a Prefeitura manter a estrutura da Vigilância Sanitária? Quando se fala em estrutura, temos que pensar no custo de Pessoal, veículos, equipamentos e instalações. Sendo assim, a taxa de vigilância sanitária deveria, em tese, cobrir o custo despendido.
Enfatiza-se o ‘em tese’, porque é comum a arrecadação de taxas não atingir o patamar ideal, qual seria, justamente, o de ressarcir a Administração do gasto do serviço. Em tais situações, o governo está subsidiando os contribuintes, utilizando outras receitas para cobrir o custo. Em outras palavras, está tirando recursos que poderiam ser aplicados em benefício da população como um todo para manter serviços endereçados apenas para uma parte (às vezes, ínfima) da coletividade.
Autor: Roberto A. Tauil, Grupo Editores Blog.