Ninguém de razoável senso crítico tem mais dúvida quanto aos reais objetivos a que se propõe a chamada “ Reforma Administrativa” enviada recentemente ao Congresso. Vendida como mais uma tábua de salvação da economia e do orçamento público do país, assim como foram as reformas trabalhista e previdenciária, tal reforma na realidade corroi a concepção atual de Estado, enquanto provedor do interesse público, bem como traz de volta a ideia patrimonialista que por muito tempo norteou exclusivamente as decisões administrativas nos altos e baixos escalões do poder.
Servidores são agentes públicos do Estado, não de governo, não cumprem sua missão institucional para agradar ou desagradar ninguém, sua forma de atuação é vinculada a lei com a finalidade única de atender ao
interesse público e não a grupos específicos, geralmente detentores de poder político/econômico. Sendo assim, a Constituição Federal de 1988 estabeleceu o instituto da Estabilidade a estes diferenciados trabalhadores dada a especificidade e complexidade do trabalho que desempenham interferindo nos interesses desses grupos ou pessoas, na maioria não republicanos, visando proteger direitos e garantias da coletividade.
Estabilidade, portanto, não é privilégio associado a pessoas, mas sim uma prerrogativa do cargo contra possíveis posturas vingativas inconformistas face uma decisão contrária do agente público que age em nome da sociedade, um escudo contra arbitrariedades.
Multiplicam-se pelo Brasil denúncias de assédio moral sofridas por agentes públicos de carreira lotados nos órgãos de fiscalização e controle que atuam na linha de frente no combate a sonegação, ao desmatamento,
ao crime organizado, ao narcotráfico: são exonerações de funções de confiança desmotivadas, paralisações de operações sem justificativa razoável, afastamentos inesperados e até mesmo ameças de morte. Como
podemos ver, o servidor público independente, concursado, que tem o cargo com prerrogativa de estabilidade incomoda muita gente. A precarização do serviço público só interessa ao bandido, ao miliciano, ao
sonegador, ao corrupto, o cidadão de bem precisa de um Estado forte para exercer sua cidadania de forma plena.
Enquanto isso, estes mesmos trabalhadores são estigmatizados, chamados de parasitas e se comemora o fato de que irão passar 2 anos sem reajuste salarial, a chamada “Granada no bolso do inimigo”, contrariando
previsão constitucinal do art. 37, inciso X. Somos inimigos de quem mesmo ?
É para “resolver este problema”, que a dita “Reforma” acaba com a estabilidade da grande maioria dos cargos públicos, burla o concurso público criando a figura do “vínculo de experiência” que será uma espécie de Big Brother do setor público onde, na prática, só será efetivado no cargo (fase posterior a aprovação no processo seletivo) quem tiver alinhamento ideológico com o governante de plantão, torcer pelo mesmo time e contar as melhores piadas para o chefe, numa repugnante afronta aos princípios da impessoalidade e moralidade. Também contraria estes princípios a permissão de livre nomeação dos amigos do rei para o exercício de cargos de natureza técnica sem concurso, o que é vedado atualmente.
Por falar em princípios, além do LIMPE atual, outros foram explicitados sem qualquer inovação prática, redundâcias, com exceção do princípio da subsidiariedade no qual o Estado só atuará naquilo em que o DEUS Mercado não quiser ou não poder atender. Ora, se a missão precípua deste tal mercado é gerar lucro, pergunto: Segurança pública, saúde e educação para toda a população, fiscalização tributária, fiscalização agropecuária e ambiental podem ou devem ser oferecidas por agentes privados ?
O que a “ Reforma Administrativa” trouxe de fato foi a introdução de um novo princípio administrativo implícito, perceptível após a leitura atenta dos seus artigos, que mudará toda a lógica de interpretação do Regime Jurídico Constitucional/Administrativo vigente, transformando significativamente a vida da nossa sociedade caso seja positivada por meio de sua aprovação pelo Congresso Nacional, será a legitimação da “lei do mais forte”, da plutocracia, a volta da importância do QI ( Quem Indica), estaremos sob a égide da Supremacia do Interesse Privado.
Autor: Odinaldo Izidoro da Silva Filho, Auditor Fisca