PROPOSTA DE REFORMA TRIBUTÁRIA EM CONSTRUÇÃO.

por Grupo Editores Blog.

MUDANÇAS PROPOSTAS:

O ano legislativo começa em Brasília. Vamos começar essa semana falando um pouco das principais linhas da proposta de reforma tributária de autoria do Deputado Federal Luiz Carlos Hauly do PSDB do Paraná. A respeito de tal reforma, o presidente Michel Temer manifestou seu entendimento no sentido de tratar-se de prioridade para o governo.

Haverá um longo debate com a sociedade nesse semestre, mas o blogdoaftm resolveu sintetizar em uma tabela os principais pontos da reforma, uma vez que há a pretensão de aglutinar-se tributos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, o que implicaria a restruturação do pacto federativo e das distribuições das competências tributárias.

É preciso lembrar que se efetivaram nos últimos anos alterações tributárias significativas em âmbito constitucional, tais como aquelas propiciadas pela Emenda Constitucional nº 42/2003, que modificou diversos artigos do Sistema Tributário Nacional e, dentre outras inovações, instituiu a previsão do regime tributário das microempresas e empresas de pequeno porte, conhecido como “Simples Nacional”, resultando num sistema único de recolhimento de oito tributos: Imposto de Renda (IR), Imposto sobre Produto Industrializado (IPI), Imposto Sobre Serviço (ISS), Imposto sobre operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre prestações de Serviços de transporte interestadual, intermunicipal e de comunicação (ICMS), além das Contribuições para o Programa de Integração Social (PIS), Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (COFINS) e Contribuição Sobre o Lucro Líquido (CSLL) e Contribuição Previdenciária Patronal (CPP); ou a Emenda Constitucional nº87/2015,que alterou a tributação do ICMS.

Embora a instituição do Simples Nacional, com a edição da Lei Complementar 123/2006, prevista na EC nº42/2003, tenha unificado a arrecadação de diversos tributos, tal emenda constitucional não extinguiu nenhum deles. Também a EC nº 87/2015 buscou aperfeiçoar a arrecadação do ICMS e mitigar a guerra fiscal estadual sem, contudo, retirar tal competência tributária dos Estados.

Já a proposta que começa a ser delineada prevê a criação de 2 novos impostos: um Imposto sobre valor Agregado Nacional e um Imposto Seletivo Nacional, que poderiam ser de âmbito estadual/municipal (em substituição aos atuais ICMS, ISS, IPI, PIS/COFINS).

O IVA proposto, deste modo, seria resultado da fusão de vários tributos, conforme abaixo demonstrado:

Ente Federativo Competência atual Proposta do Deputado Luiz Carlos Hauly
UNIÃO Imposto sobre Produto Industrializado  (IPI). Extinto, sendo incorporado aos novos impostos propostos
Contribuição Social sobre o Lucro Liquido (CSLL). Extinto, sendo incorporado ao Imposto de Renda (IR).
Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). Extinto.
Programa Integração Social (PIS) Extinto, sendo incorporado aos novos impostos propostos
Não há Criação da Contribuição sobre Movimentação Financeira.
Imposto de Renda (IR) Imposto de Renda (IR) – uma reformulação total do sistema, buscando-se alcançar bases antes pouco exploradas. Além disso, deve-se garantir sua efetiva progressividade, de modo a taxar, de fato, mais gravosamente os ricos.
Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Extinto, sendo incorporado aos novos impostos propostos
Estados Imposto sobre Veículos Automotores (IPVA) Passará para a competência dos municípios, recebendo o recurso integralmente e sendo responsável pela sua fiscalização.
Imposto sobre Transmissão Causa Mortis ou Doações de bens e direitos (ITCMD) Competência dos Municípios ou da União, ainda não definido.
Não há Imposto sobre Valor Agregado – IVA – que agregará os antigos ICMS, IPI, PIS, Cofins e ISS, e será regulado por lei federal, com arrecadação centralizada e

fiscalização unificada.

Imposto sobre Sobre Serviços de Qualquer Natureza – ISSQN. Extinto, sendo incorporado aos novos impostos propostos.
Municípios

MUDANÇAS NAS TRANSFERENCIAS CONSTITUCIONAIS:

Os Estados e o Distrito Federal passarão a contar com o Imposto sobre Valor Agregado IVA, que será regulado por lei federal, com arrecadação centralizada e fiscalização unificada, através de um “Superfisco”. O imposto não será cumulativo, com concessão de crédito financeiro (tudo o que a empresa adquire e usa na atividade gera crédito) e será cobrado “por fora” (sem incidência de imposto sobre imposto). A arrecadação será integralmente no destino e não onerará bens do ativo fixo e nem produtos exportados. Além disso, terá alíquotas mais baixas para medicamentos e produtos alimentares

A ideia é trazer a alíquota do IVA para valores compatíveis com a média dos países desenvolvidos, criando também um Imposto Seletivo Nacional monofásico sobre alguns produtos como: petróleo, combustíveis e lubrificantes de qualquer origem, energia elétrica, bebidas alcoólicas e não alcoólicas, aparelhos eletroeletrônicos e eletrodomésticos, veículos automotores, supérfluos, telecomunicações, e qualquer outro produto ou serviço indicado. Este imposto seria regulado por lei complementar e teria a arrecadação centralizada e fiscalizada pelos “Superfisco”. Ainda é necessário ponderar se o  Imposto Seletivo será o único tributo a incidir sobre esses produtos, ou se incidirá em conjunto com o IVA.  Esse ponto ainda será discutido ao longo do processo.

Caso os Municípios realmente percam a competência sobre o imposto sobre serviços de qualquer natureza – ISSQN, há a predisposição de centralizar na esfera local a arrecadação dos tributos sobre o patrimônio. Estuda-se o caso do Imposto sobre Transmissão Causa Morte e Doações de qualquer natureza – ITCMD; ponderando-se se ele deveria ser da esfera municipal ou federal, tornando-o um significativo  imposto sobre o patrimônio, em substituição ao Imposto sobre Grandes Fortunas, como é feito nos Estados Unidos.

A eventual transferência do ITCMD para a esfera municipal seria, contudo, absolutamente insuficiente para cobrir as perdas com o ISS dos grandes municípios. O problema da queda de arrecadação  das grandes metrópoles permaneceria mesmo com a transferência para elas de 100% da receita do IPVA, também cogitada no projeto. Já a justificativa para uma possível inserção do ITCMD na competência federal decorre do fato que, geralmente, os grandes patrimônios estão espalhados por diversos Municípios, sendo mais coerente onerá-los com um tributo de alcance nacional, além de que a Receita Federal estaria melhor aparelhada para uma fiscalização dessa natureza, em conjunto com o Imposto de Renda.

FISCALIZAÇÃO:

Quanto à fiscalização do IVA, o deputado entende ser importante a criação de um novo órgão, o “Superfisco”, que agregará administrações tributárias que compartilhariam tal atribuição. Esse órgão será dirigido por um Secretário Nacional que contaria com Superintendentes em cada unidade federada (ou possivelmente em regiões que agreguem alguns Estados), e teria estruturas de carreira e remuneratória unificadas. Além disso, seria pautado pelos princípios da unidade, indivisibilidade e independência funcional.

A Receita Federal do Brasil concentraria a fiscalização e arrecadação do novo Imposto de Renda, das contribuições previdenciárias dos empregadores e dos empregados, da contribuição sobre movimentação financeira, e dos tributos aduaneiros e regulatórios.

EXPECTATIVA:

Para o Deputado, a proposta pretende garantir que os entes Federados sejam sócios do sucesso do País e que haja o compartilhamento do resultado das arrecadações. Assim, evita-se que se concentre a arrecadação em tributos não partilháveis, como foi feito pela União com as contribuições sociais, garantindo que os Estados, o DF e os Municípios recebam uma parte do Imposto de Renda, bem como que a União e os Municípios tenham direito a um quinhão do IVA e do Imposto Seletivo.

De qualquer modo, o Deputado reconhece que para se evitar as desconfianças naturais com uma mudança tão profunda, nos primeiros anos da reforma, é preciso garantir que cada ente federado mantenha o quinhão de sua  arrecadação, nos mesmos patamares dos anos anteriores, evitando-se perdas com o novo modelo. Para isso, será preciso recalcular a participação de cada Município, Estado e União na arrecadação dos últimos anos, no que se refere aos tributos que estão sendo alterados, garantindo que  esse mesmo percentual lhes seja entregue com base na arrecadação dos novos tributos. Será preciso estabelecer  uma regra de transição que, em alguns anos, transfira essa partilha com base nas arrecadações anteriores para o novo modelo.

Percebe-se do exposto, que a relatoria, sob a responsabilidade do Deputado Luiz Carlos Hauly, implica a apresentação de uma proposta de reforma tributária que busque, fundamentalmente, nas palavras do relator, os seguintes objetivos: crescimento econômico e neutralidade na competitividade entre as empresas; criação de empregos; justiça social com a eliminação da pobreza; justiça fiscal; garantia de partilha aos estados e municípios; desenvolvimento sustentado; distribuição de renda e riqueza; efetividade da capacidade contributiva; equidade; seletividade de acordo com a essencialidade do produto ou serviço; que seja privilegie a tributação direta, de caráter pessoal e progressiva; com equilíbrio entre o fator trabalho e o fator capital; sem guerra fiscal; com desoneração das exportações e dos bens do ativo fixo;  diminuição do contencioso fiscal administrativo e judicial; com desburocratização e simplificação.

A tarefa hercúlea fica ainda mais expressiva quando são colocados alguns fatos. O que se arrecada de ISS em determinados municípios é superior à soma dos tributos auferidos em muitos Estados. Por exemplo: a receita referente ao ISS do município de São Paulo (aproximadamente de 13 bilhões de Reais) equivale à receita tributária total, incluindo-se não só o ICMS, mas ainda o IPVA, o ITCMD e taxas do Estado de Pernambuco (nona maior arrecadação tributária estadual do país), o que equivale dizer que o Município de São Paulo arrecada sozinho, e considerando-se apenas o ISS, mais do que 19 Estados, incluindo-se todas as suas receitas tributárias!

Constata-se ainda que há uma enorme heterogeneidade na distribuição da arrecadação do ISS, e concentração de suas receitas em grandes municípios: dos 50 bilhões de Reais arrecadados com esse imposto no Brasil, 50% é auferido em apenas 10 municípios; 70% em 50 municípios; 80% em 120 municípios. Se considerarmos que tais municípios mantém mais de 80 milhões de habitantes, percebem-se elevados riscos a serem enfrentados pelo projeto que busca aperfeiçoar o sistema tributário:

  • Não perder o know-how desenvolvido pelas administrações tributárias municipais quanto à fiscalização e arrecadação de grandes prestadores de serviços como agentes do sistema financeiro (bancos, leasing, factoring e operadores de cartões de crédito); empresas de TI, construção civil e da área de saúde;
  • Manter, em uma eventual adoção do IVA, a necessária capilaridade da fiscalização tributária, alcançada hoje pelos Auditores-Fiscais do ISS e Simples Nacional;
  • Não permitir que o atual quadro de Auditores-Fiscais das administrações tributárias municipais torne-se ocioso, gerando perda de eficiência e graves prejuízos a tais entes.

Em linhas gerais, e de forma não exaustiva, o blogdoaftm, com este artigo tentar apresentar as diretrizes e alguns desafios da proposta de reforma tributária de autoria do Deputado Luiz Carlos Hauly.

Colaboraram:

Adrianal Elly França de Melo: Fiscal Fazendário de Ribeirão Preto.

Cássio Vieira Pereira dos Santos – Professor de Direito Financeiro e Econômico da Universidade de São Caetano do Sul – USCS.

Editon Volpi Gomes: Fiscal Fazendário de Ribeirão Preto.

Miqueas Liborio de Jesus: Auditor Fiscal da Receita Municipal de Joinville.

Rafael Aguirrezábal – Diretor de Assuntos Tributários da Confederação Nacional das Carreiras Típicas de Estado – CONACATE.

 

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