Como água e óleo: A tecnologia e a gestão pública.

por Grupo Editores Blog.

 

Por que temos a impressão de que tecnologia e gestão pública são pertencentes a diferentes mundos?

 

Eu diria até um paradoxo: De um lado a burocracia da gestão pública em geral, aqui me concentrarei na área tributária, de outro a tecnologia com toda a facilidade e agilidade esperada.

 

No início dos meus trabalhos como desenvolvedor de software para a área de gestão pública, eu me perguntava: Por que emitir uma nota fiscal depende de tanta informação desnecessária e o contribuinte precisa gerar a guia de recolhimento do imposto? Por que os auditores fiscais pedem tanto de relatórios?

 

Sinceramente, sem nenhum julgamento prévio, para cada uma destas perguntas sempre havia uma resposta nas entrelinhas, a herança. Necessidades pertinentes para um contexto que não se faziam mais necessárias, mas que, por conta de falta de inovação, foram mantidas ao longo do tempo.

 

Nos anos 2000, tínhamos sistemas desenvolvidos para rodar em rede local, instalados na máquina do usuário que permitam a troca de informações entre os usuários envolvidos. Tínhamos aqueles monitores brancos, de 14 polegadas e placas de vídeo que permitiam baixas resoluções. Sistema operacional Windows 98 ou Windows XP. O software a ser desenvolvido deveria considerar este ambiente, então: Faça-se o “sistema desktop”!

 

Uma tela de fundo, com menus em cascata (mostravam uma lista de opções), que ao serem clicados abriam uma janela que deveria ser menor. A tentativa era dar a sensação de que o usuário ainda estava dentro de um mesmo sistema, telas dentro de telas, telas sobre telas.

 

 

E as informações, lembra da digitalização do processo? Então, no documento impresso, precisávamos ter o livro, a folha e mais uma infinidade de informações pertinentes ao tipo de processo. Literalmente colocava-se na tela do sistema 100% das informações que estavam no documento impresso. Obviamente isso já foi um avanço, podia-se encontrar um processo sem precisar vasculhar as pilhas dispostas sobre as mesas, mas ainda existia o processo físico. Em relação aos impostos a sistemática era semelhante, o contribuinte precisava baixar um aplicativo, instalar localmente, inserir as informações no software, gerar arquivos e transmitir à prefeitura.

 

Hoje, com a evolução da tecnologia, redes e internet mais rápidas, o contribuinte pode emitir NFS-e online, mas sabe todos aqueles campos dos formulários impressos que estavam nas telas de “sistemas desktop”, então ainda continuam lá. A série que era necessária para diferenciar o bloco que o contribuinte estava utilizando ao emitir a nota, o tipo de documento para saber se o documento era um bloco ou um formulário contínuo, etc. Os municípios em geral estão tão acostumados a serem reativos que é o próprio contribuinte quem precisa acessar o sistema, realizar o fechamento do tal livro e então realizar a emissão de um boleto para recolhimento do imposto. Imagine só se as operadoras de telefonia, água e luz aguardassem os consumidores acessar o sistema para receber pelo serviço prestado?

 

Todavia, esse não é um privilégio apenas do contribuinte! Os servidores estão tão acostumados a utilizar sistemas arcaicos e a pedir relatórios que não conseguem enxergar alternativas para realizar o seu trabalho. Isso é uma evidência clara de que os sistemas são simplesmente repositórios de dados. Inclusive, nesse ponto vemos a vulgarização do termo “inteligência”, visto que estão apenas “guardando dados”.

 

Enfim, a falta de inovação parte de todos os lados, mas principalmente dos sistemas ofertados pelos prestadores de serviços. Não adianta jogarmos na conta do município, pois como Henry Ford disse certa vez: “Se perguntasse aos meus clientes o que eles queriam, me pediriam cavalos mais rápidos!”. Nesse ponto nos deparamos com outro termo vulgarizado: a “inovação”. Colocar um formulário em uma página web para que o contribuinte realize o preenchimento não é inovação! Por mais que saibamos que inovação não é necessariamente a criação de algo novo, neste caso trata-se novamente apenas de digitalização.

 

Os municípios precisam repensar a contratação de sistemas, pois a falta de dinheiro não está na escassez da arrecadação e sim na má utilização dos recursos. Os departamentos estão cada vez mais inchados com a justificativa de que precisam de mais servidores para trabalhar com o volume de informações, quando na verdade o que realmente precisariam é contratar sistemas realmente bons, com o objetivo de otimizar e automatizar o que for possível. Atualmente o intelecto dos servidores está sendo subutilizado para tarefas que fazem o município andar de lado.

 

Autor: Rubsney Nascimento.

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1 comentário

José Henrique Geraldes Mariani 3 de abril de 2018 - 07:43

Sei bem o quanto é dificil utilizar tecnologia na Administração Pública!
Em partes até consegui, em conjunto com a empresa de tecnologia do município, desenvolver e implantar um sistema gerencial e operacional da administração tributária em São José do Rio Preto – SP.
O trabalho foi feito a duras penas tendo em vista que muitas vezes implatar a tecnologia da informação na Administração Pública nao é conveniente para muitos porque trás controles de desempenho, de qualidade no trabalho trás também transparecia!
Sai da coordenação do projeto em janeiro de 2017 e nada mais foi implementado deixando o sistema no meio do caminho embora estar sendo utilizado com sucesso mesmo estando inacabado!
As administrações públicas poderiam fazer muito mais com muito menos dinheiro público gasto!
Qual seria o caminho para as pessoas entenderam que os tempos mudaram e a administração publica nao suporta mais pagar ineficiência!

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