A fim de identificar os determinantes do potencial de arrecadação do imposto sobre propriedade predial e territorial urbana (IPTU) no Brasil, bem como a utilização dessa capacidade, este artigo propõe uma análise comparativa dos municípios brasileiros aplicando a teoria dos conjuntos fuzzy. A aplicação dessa metodologia na área das finanças públicas é pioneira no Brasil, o que proporcionou resultados inéditos em matéria de tributação da propriedade.
Os resultados confirmaram o que analistas e até mesmo dirigentes municipais já apontaram há tempos: a maioria dos municípios brasileiros não utiliza todo o seu potencial de arrecadação do IPTU — fato que tende a ser mais crítico nas cidades de menor porte e que dependem mais de recursos de outras esferas de governo. O artigo inova ao mensurar esse potencial a partir de uma análise comparativa entre cidades com semelhantes características.
1. INTRODUÇÃO
A cobrança de Imposto sobre Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU), de competência municipal, atravessa adversidades de toda a ordem no Brasil. Sua arrecadação gira em torno de R$ 25 bilhões/ano, o que representou 0,51% do PIB de 2014 (RFB, 2015).
Embora responda por aproximadamente 1,5% da receita tributária nacional, o imposto ocupa o segundo lugar entre os impostos mais rejeitados pelos brasileiros, segundo pesquisa de opinião pública sobre os impostos e os problemas nacionais. Não têm sido raras as derrotas sofridas na justiça por prefeituras que tentaram corrigir a aplicação do imposto — como no caso da maior cidade do país, a capital de São Paulo, que fomentou uma série de questionamentos em outras cidades.1 Os embates no Poder Judiciário geraram grande repercussão na mídia e se misturaram às críticas generalizadas ao imposto, que muitas vezes se misturam a reclamações contra outras ações das administrações públicas, não relacionadas necessariamente com a tributação.
Na contramão do sentimento da sociedade civil, análises técnicas preliminares apresentaram evidências
de que a arrecadação de IPTU estaria demasiado baixa na maior parte do território nacional (De Cesare e Marín, 2008; Bahl, 2009; Sepulveda e Vazquez, 2009; Afonso, Araújo e Nóbrega, 2012), independente de região, tamanho, tipo ou economia local.
Estimativas iniciais indicam que, para o conjunto das prefeituras do país, a arrecadação do IPTU representou cerca de 19,4% da totalidade da receita tributária própria em 2014. Quinze anos antes, em 2000, tal participação chegou a alcançar 27%. No entanto, a média nacional não foi observada na maior parte dos municípios:em aproximadamente metade das localidades o referido tributo não chegou a 10% da receita tributária própria.
Outra evidência sobre a baixa utilização da capacidade do referido imposto pode ser observada na comparação com outros tributos. Pouco mais de 96% dos municípios brasileiros tiveram uma arrecadação estimada de Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) superior à de IPTU em 2014. Já a relação para o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) e para o Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) foi de, respectivamente, 87,7% e 45,9% no mesmo ano. Esse último dado chama muito a atenção, pois o ITBI deveria ser residual perto da arrecadação do IPTU, entretanto até mesmo uma capital (João Pessoa/PB) apresenta uma arrecadação de ITBI superior à de IPTU.
Nesse contexto, cabe questionar se há potencial de arrecadação do IPTU e se esse potencial é de fato utilizado pelos municípios brasileiros. E, ainda, quais são as localidades no país que melhor exploram ou utilizam o IPTU.
Com o objetivo de responder a essas perguntas e fornecer subsídios ao debate acerca da tributação imobiliária no Brasil (identificar oportunidades e restrições para melhor aproveitamento do IPTU como fonte de financiamento dos municípios brasileiros), este artigo propõe avaliar o potencial de arrecadação e a exploração desse potencial do imposto imobiliário urbano cobrado por mais de 5.500 prefeituras no país. O diagnóstico procurará quantificar e relativizar diversas variáveis (tributárias e socioeconômicas) que contribuem diretamente para a determinação do potencial e da exploração do imposto por parte das unidades locais.
Compreender os fatores que contribuem para o cenário de grande diversidade que marca os municípios no Brasil é fundamental para qualquer avaliação sobre o IPTU. O elemento determinante da justa utilização desse imposto em um município pode residir em explicações que vão além da simples vontade política. Entre os fatores que devem ser ponderados estão: tamanho da economia, proximidade com a população (eleitor), deficiências administrativas, legislação e baixa necessidade de gerar recursos próprios. Em um país que tem como característica profundas disparidades, não há uma única explicação para diferentes níveis de exploração das competências tributárias locais e, portanto, não há um único modelo a ser seguido, caso se tenha como meta a dinamização das receitas daí provenientes.
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Autores:
Kleber Pacheco de Castro
Universidade do Estado do Rio de Janeiro / Programa de Pós-Graduação em Ciências Econômicas
Rio de Janeiro / RJ — Brasil
José Roberto Rodrigues Afonso
Instituto Brasiliense de Direito Público / Escola de Direito de Brasília
Brasília / DF — Brasil