Reforma ampla ou ajustes pontuais?

por Grupo Editores Blog.

 

Na discussão sobre a reforma dos tributos sobre o consumo no Brasil – ICMS, ISS, PIS, Cofins e IPI – uma questão que surge recorrentemente é sobre se deve ser feita uma reforma ampla, ou seja, a substituição dos tributos atuais por um novo Imposto sobre o Valor Adicionado (IVA), ou apenas ajustes nos tributos atuais. Neste artigo vou procurar explicar por que entendo que o ideal é uma reforma ampla.

Há vários argumentos de ordem técnica que resultam de problemas que não podem ser resolvidos mantendo-se os tributos atuais. O primeiro é a existência de tributos – como o ISS – que incidem de forma cumulativa, onerando não apenas o consumo, mas também investimentos e exportações, prejudicando o crescimento do País.

 

O segundo argumento diz respeito à fragmentação da base de incidência dos tributos. Enquanto um bom imposto sobre o consumo incide sobre uma base ampla de bens, serviços e direitos, no Brasil o ICMS incide sobre bens (e alguns serviços) e o ISS sobre os demais serviços. Essa fragmentação tem várias consequências negativas. Por um lado, amplia-se a incidência cumulativa, pois o ICMS incidente sobre mercadorias adquiridas por contribuintes do ISS não gera crédito. Por outro lado, cria-se uma zona cinzenta entre o que é mercadoria, serviço ou direito – que só tende a se ampliar com o avanço da nova economia –, gerando controvérsias entre os Fiscos e insegurança jurídica para os contribuintes.

Em terceiro lugar, há problemas que resultam da incidência restrita de alguns tributos. Isso ocorre no caso do IPI, que incide apenas na industrialização (ao contrário do IVA, que incide em todas as operações até o consumidor), gerando grande contencioso, dada a possibilidade de o contribuinte distribuir a margem de lucro entre a industrialização (tributada) e a distribuição (não tributada). Ocorre, também, no caso do PIS e da Cofins, que incidem apenas sobre as pessoas jurídicas, deixando de alcançar operações realizadas por pessoas físicas, mesmo quando estas são grandes produtoras – o que ocorre principalmente na agropecuária.

 

Mas há também argumentos de ordem política que justificam uma reforma ampla dos tributos sobre bens e serviços. Por um lado, é muito mais simples eliminar a profusão de benefícios fiscais distorcivos atualmente existentes por meio da substituição dos tributos atuais por um novo IVA (com uma transição, para permitir que as empresas se adaptem à nova realidade) do que por meio da manutenção dos tributos atuais. De fato, mantendo-se os tributos atuais, seria necessário rever os incentivos um a um, o que geraria uma pressão política muito maior para sua manutenção.

 

Por outro lado, o custo político de uma sequência de reformas pontuais pode ser tão grande – ou até maior – que o de uma reforma ampla. Tomem-se como referência apenas duas mudanças que já foram discutidas: a eliminação do regime cumulativo do PIS/Cofins (ou seja, a adoção do regime não cumulativo para todos os setores) e a redução da alíquota interestadual do ICMS, de modo a que seja tributado no destino, como deve ser um IVA. As resistências a essas duas mudanças já são conhecidas e são relevantes, envolvendo não apenas setores que se sintam prejudicados, mas também Estados que perdem receita com a transição para o destino e perdem o poder de conceder benefícios fiscais. No agregado, é provável que o custo político dessas duas mudanças apenas seja tão grande quanto o de uma reforma ampla.

 

Quando colocamos na balança os enormes benefícios resultantes de uma reforma ampla, em termos de melhoria da qualidade do sistema tributário e do ambiente de negócios, fica claro que essa é a melhor opção. Não se trata, aqui, de subestimar as dificuldades políticas de implementar uma ampla reforma dos tributos brasileiros sobre o consumo, mas apenas de reconhecer que, do ponto de vista da relação custo-benefício, essa é uma opção muito superior à implementação de ajustes nos tributos existentes.

 

Fonte: Estadão.

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