A MP DA LIBERDADE ECONÔMICA E OS MUNICÍPIOS.

por Grupo Editores Blog.

 

O Governo Federal publicou a Medida Provisória n. 881, denominada com o pomposo (e exagerado) nome de “Declaração de Direitos de Liberdade Econômica”, com o objetivo de regular as normas de proteção à livre iniciativa e, de certa forma, restringir a atuação do Estado como agente normativo e regulador.

 

Pode-se dizer que essa MP é um passo inverso ao poder de polícia dos entes públicos, a entender como poder de polícia o elenco de dispositivos legais de proibições, ou de obrigações de não fazer, tendo por base a pretensa defesa do direito coletivo contra excessos dos direitos individuais.

 

A propósito, entendemos que é equivocada a ideia de que poder de polícia se resume em obrigações de não fazer (é proibido isso, é proibido aquilo). O poder de polícia agrega, também, as obrigações de fazer, tanto do Poder Público quanto de particulares. O Poder Público se obriga a fazer a sua parte, por exemplo, manter limpos os logradouros públicos, coletar o lixo domiciliar, tapar os buracos das ruas, fazer funcionar a iluminação pública etc. Os particulares, por sua vez, manter limpos os terrenos baldios, manter as calçadas desimpedidas e conservadas, manter a higiene e segurança de seus estabelecimentos, respeitar os direitos da vizinhança etc.

 

A referida Medida Provisória interfere diretamente no preceito constitucional da autonomia dos Municípios (e também dos Estados), mas tal discussão fica para outro debate. Este artigo pretende comentar as consequências diretas relacionadas com as atuais normas municipais, pelo menos da maioria dos Municípios.

 

Vamos a elas, mas, antes, uma observação: chama a atenção o gosto do redator da MP 881 com a palavra ‘disposto’! Só no art. 1º e seus parágrafos, ele repete oito vezes a expressão ‘disposto’!

 

A – Prazo de liberação da licença de funcionamento, ou Alvará de Funcionamento.

 

Os Municípios terão que estabelecer em regulamento um prazo máximo para deferir ou indeferir a licença de funcionamento da atividade econômica. Ou seja, a partir do momento em que o interessado entregar todos os elementos necessários à instrução do processo, ele receberá um prazo expressamente determinado para conclusão das análises (inclusive vistoria no local, se for necessária). Caso esse prazo se esgote sem a resposta formal da repartição, esse ‘silêncio’ significará aprovação tácita do pedido, podendo o interessado fazer funcionar a sua atividade sem ter ainda a respectiva licença.

 

E não poderá o Município ‘inventar’ novas exigências para casos específicos. Conforme expresso em regulamento, o tratamento terá de ser isonômico, ou seja, idêntico para todos os interessados nas mesmas condições.

 

B – Os Municípios não poderão exigir cópias dos documentos para arquivá-los. Terá de usar o microfilme ou, mais fácil, digitalizar os documentos e guardá-los eletronicamente. Até o dia de hoje, só tivemos a oportunidade de conhecer um Município que não guarda documento em papel. Usa scaner no atendimento e o seu arquivo é totalmente eletrônico.

 

C – Os Municípios devem estabelecer, por regulamento, a relação das atividades de baixo risco, que serão dispensadas de vistoria prévia. Caso o Município não tenha previsão das atividades de baixo risco, será obrigado a aplicar a relação prevista pelo Comitê para Gestão da Rede Nacional para Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios – CGSIM, cuja relação de atividades de alto risco é a seguinte (para facilitar, englobamos certas atividades afins):

 

Fabricação de produtos de qualquer espécie, inclusive panificadoras;

 

Serviços de pulverização e controle de pragas;

 

Curtimento e preparação de couros;

 

Coleta de resíduos perigosos;

 

Comércio varejista de produtos farmacêuticos, com manipulação de fórmulas;

 

Postos de combustíveis e comércio varejista de gás liquefeito de petróleo (GLP);

 

Comércio varejista de produtos saneantes domissanitários;

 

Comércio varejista de fogos de artifício e artigos pirotécnicos;

 

Serviços de funerárias, cemitérios e crematórios;

 

Serrarias;

 

Serviços gráficos;

 

Reprodução de vídeo, som, software;

 

Reforma de pneumáticos;

 

Pedreiras;

 

Aparelhamento de placas e pedras;

 

Metalurgia e Fundição;

 

Serviços de confecção de armações metálicas para a construção;

 

Recondicionamento de baterias e acumuladores para veículos automotores;

 

Construção de embarcações;

 

Lapidação de gemas;

 

Cunhagem de moedas e medalhas;

 

Comércio atacadista de medicamentos e drogas de uso humano e veterinário;

 

Comércio atacadista de tintas, vernizes e similares;

 

Comércio atacadista de materiais de construção em geral;

 

Comércio atacadista de combustíveis realizado por transportador retalhista;

 

Comércio atacadista de produtos químicos em geral;

 

Supermercados e hipermercados;

 

Farmácias e Drogarias;

 

Transporte coletivo de passageiros, inclusive transporte escolar;

 

Serviços de excursões turísticas com veículos próprios;

 

Transporte rodoviário;

 

Armazéns gerais;

 

Depósito de mercadorias de terceiros;

 

Terminais rodoviários, ferroviários e metroviários;

 

Estacionamento de veículos;

 

Aeroportos;

 

Hotéis, Motéis e Apart-hotéis;

 

Cinemas e teatros;

 

Casas de festas e eventos;

 

Hospitais, Clínicas e Ambulatórios;

 

Laboratórios de análises;

 

Clubes sociais;

 

Atividades esportivas de qualquer espécie;

 

Lavanderias, Tinturarias e Toalheiros;

 

Parques de diversões e parques temáticos;

 

Discotecas, salões de dança e similar;

 

Atividades de recreação de qualquer espécie.

 

Embora não estejam incluídas, entendemos que se trata de atividades de alto risco as Universidades, Escolas e Creches.

 

Deste modo, as demais atividades, por eliminação, seriam de baixo risco. Em outras palavras, não cabe perder tempo vistoriando estabelecimentos do tipo escritórios e consultórios de profissionais liberais, lojas de comércio (com algumas exceções), pequenas oficinas de consertos e reparos, e outros mais.

 

D – A fiscalização do estabelecimento deverá ser feita posteriormente à liberação da licença, isso se for feita. Poderá ser realizada de ofício ou como consequência de denúncia, mas sempre depois da liberação do alvará.

 

E – É expressamente vedado aos entes públicos:

 

I – criar reserva de mercado ao favorecer, na regulação, grupo econômico, ou profissional, em prejuízo dos demais concorrentes;

 

II – redigir enunciados que impeçam a entrada de novos competidores nacionais ou estrangeiros no mercado;

 

III – criar privilégio exclusivo para determinado segmento econômico, que não seja acessível aos demais segmentos;

 

IV – criar demanda artificial ou compulsória de produto, serviço, ou atividade profissional, inclusive de uso de cartórios, registros ou cadastros;

 

V – introduzir limites à livre formação de sociedades empresariais ou de atividades econômicas; e

 

VI – restringir o uso e o exercício da publicidade e propaganda sobre um setor econômico, ressalvadas as hipóteses expressamente vedadas em lei.

 

Bem, em linhas gerais são essas as regras que os municípios terão de observar.

 

Autor: Roberto A. Tauil, Grupo Editores do Blog.

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1 comentário

Felipe Cortelini 10 de maio de 2019 - 09:04

Olá! Entendo que a interpretação em dois pontos é um pouco distinta da exposta no texto.

1. A fiscalização posterior é para confirmar se a empresa tinha o direito de trabalhar SEM ALVARÁ. Na MP chamam de atos públicos de liberação. O que a MP considera um direito para empresas de baixo risco.
Art. 3º São DIREITOS de toda pessoa, natural ou jurídica, essenciais para o desenvolvimento e o crescimento econômicos do País, observado o disposto no parágrafo único do art. 170 da Constituição:
I – desenvolver, para sustento próprio ou de sua família, atividade econômica de baixo risco, para a qual se valha exclusivamente de propriedade privada própria ou de terceiros consensuais, SEM A NECESSIDADE DE ATOS PÚBLICOS DE LIBERAÇÃO da atividade econômica;
§ 3º A FISCALIZAÇÃO DO EXERCÍCIO DO DIREITO de que trata o inciso I do caput será realizada posteriormente, de ofício ou como consequência de denúncia encaminhada à autoridade competente.
Qual o direito que se fiscaliza? O de exercer a atividade econômica de baixo risco sem a necessidade de atos públicos. Entre estes o Alvará, conforme o § 5º, do artigo 1º.

2. O estabelecimento de prazos é opcional para Estados e Municípios, conforme
Art. 3º, IX – ter a garantia de que, nas solicitações de atos públicos de liberação da atividade econômica que se sujeitam ao disposto nesta Medida Provisória, apresentados todos os elementos necessários à instrução do processo, o particular receberá imediatamente um PRAZO expresso que estipulará o tempo máximo (…)

Art. 1º, § 4º O disposto no inciso IX do caput do art. 3º NÃO SE APLICA aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, exceto se (…)

Entendo que o Art. 3º, inciso II afeta também as legislações de Posturas Municipais, como segue:
II – produzir, empregar e gerar renda, assegurada a liberdade para desenvolver atividade econômica em qualquer horário ou dia da semana, observadas (…)

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