Depois da Previdência virá a reforma salarial.

por Grupo Editores Blog.

 

O governo enviará ao Congresso ainda este ano um projeto de lei com a nova política de pessoal do setor público federal, que reduzirá o salário de ingresso do servidor para os padrões do setor privado. Isso significa que o salário de ingresso para nível superior da carreira de gestor (uma das 250 carreiras do Executivo), que abarca Banco Central e Tesouro Nacional, por exemplo, cairá dos atuais R$ 16.933,00 para R$ 5 mil, que é o salário inicial de um professor universitário (para quem nada muda). Nos concursos de nível médio o salário será de no máximo R$ 2.800,00. A medida, quando aprovada, se aplicará aos novos funcionários.

 

A proposta é de “modernização da gestão de pessoas” e está sendo preparada pelo Ministério do Planejamento com vários objetivos: reduzir o ritmo de crescimento da folha de salários da União em cerca de R$ 69,8 bilhões em 10 anos e em R$ 294 bilhões em 20 anos, como parte relevante do ajuste fiscal; reduzir a desigualdade gritante entre os vencimentos do setor público e o seu equivalente no setor privado; ampliar os níveis de progressão dos funcionários federais e introduzir mecanismos de avaliação de desempenho, dentre outros.

 

Hoje o servidor que entra na administração pública federal com salário de quase R$ 17 mil por mês chegará ao topo da carreira em 13 anos, ganhará R$ 24.148,00 e não terá mais estímulo para melhorar o seu desempenho. Com a redução do salário de entrada, serão 30 os níveis de progressão e a promoção ocorrerá por mérito.

 

Governo vai cortar os salários iniciais e ampliar a progressão

 

A folha de pagamento da União é a segunda maior despesa obrigatória do orçamento, responsável por 12,6% do gasto total. A primeira é a previdência social, que responde por 57,1% da despesa. Os gastos com pessoal será, portanto, também a segunda iniciativa a ser enfrentada para viabilizar o cumprimento do testo do gasto. A expectativa da área econômica é de que tão logo seja votada a PEC da Previdência Social, o governo encaminhe esse projeto de lei ao Congresso.

 

Entre 2010 e 2015 a folha da União teve crescimento real de 7,4%. Nos Estados a expansão real foi de 20,2% e nos municípios, de 27,3% em igual período.

 

O projeto pretende mudar a política de pessoal apenas do poder Executivo Federal. Espera-se, contudo, que o Legislativo e o Judiciário, poderes independentes onde os vencimentos são bem mais elevados, tenham iniciativas semelhantes, assim como os governos estaduais.

 

Para o assessor especial do Planejamento, Arnaldo Lima, que está envolvido diretamente nesse trabalho, a carreira pública continuará sendo atrativa mesmo com a redução do salário inicial. Isso porque na estrutura da renda no Brasil os trabalhadores que ganham R$ 4,9 mil por mês estão entre os 10% mais ricos. No governo, eles terão ainda estabilidade no emprego e jornada de 40 horas semanais, com quatro horas a menos de trabalho semanal do que no setor privado.

 

Recebem, além disso, uma série de benefícios que representaram gastos de R$ 16,6 bilhões no ano passado, com o pagamento de seis tipos de auxílios – alimentação, creche, transportes, funeral, moradia, natalidade – além de um regime próprio de previdência, assistência médica e odontológica, diárias e ajuda de custos. Desses, R$ 12,9 bilhões foram para os funcionários federais e os R$ 3,7 bilhões restantes distribuidos entre o Legislativo, Judiciário e Ministério Público da União.

 

Nos próximos dez anos cerca de 39% da força de trabalho do setor público federal se aposenta. Os servidores que ingressarem pelo novo regime vão custar aos cofres da União até 70% menos do que os atuais. Os dados comparativos entre setor publico e privado não capturam os bônus eventualmente recebidos por trabalhadores da iniciativa privada nem os planos de previdência e outros benefícios pagos ao funcionalismo público.

 

As medidas propostas no projeto de lei parecem severas. Estudo feito pelo Banco Mundial, a pedido do ex-ministro da Fazenda, Joaquim Levy, e divulgado na quarta feira, mostra, no entanto, que há um prêmio salarial de 67% no setor publico federal e de 31% nos Estados, em relação aos salários pagos no setor privado, considerando o nivel de escolaridade. Nos municípios não há prêmios. Essa é uma diferença recorde se comparada com 53 países da amostra da instituição onde esse prêmio existe e é, em média, de 16%.

 

O estudo cita casos que dão a dimensão da diferença entre os trabalhadores do setor privado e público. Exemplo: um advogado recém formado recebe salário de R$ 3.100,00 no setor privado. O mesmo recém formado entrará na Procuradoria Geral da Fazenda com salário inicial de R$ 18.283,00. Se conseguir emprego no Legislativo ou no Judiciário, começará a vida profissional ganhando cerca de R$ 30 mil. O teto da remuneração no governo federal, nem sempre respeitado, é de R$ 33.763,00, que é o salário pago ao ministro do Supremo Tribunal Federal.

 

Dados da PNAD de 2015 indicam que 77% dos funcionários públicos federais estão entre os 40% mais ricos do país e 54% desses servidores são parte do quintil superior da distribuição da renda.

 

“Os altos salários do servidor público constituem uma forma de redistribuição de renda dos mais pobres e da classe média em favor dos mas ricos”, diz o texto do Banco Mundial. Afinal, salienta a instituição, os servidores são pagos com o dinheiro dos impostos cobrados da sociedade que, por sua vez, também são regressivos. Ou seja, penalizam os mais pobres com excessiva tributação indireta.

 

Sem restrições políticas ou político-eleitorais para fazer sugestões, os técnicos do Banco Mundial estimaram que o congelamento dos salários nominais dos servidores reduziria o prêmio de 67% hoje para 16% em 2024. A correção dos salários pela inflação faria essa redução de forma bem mais lenta, chegando a 39% em 2029.

 

O documento sugere, ainda, que a redução dos salários iniciais dos servidores públicos – tal como o governo havia anunciado que faria – deve ser acompanhada de flexibilidades para poder pagar ao funcionário com base no desempenho de suas funções ao longo da carreira e na experiência acumulada.

 

Claudia Safatle é diretora adjunta de Redação Valor Econômico.

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